Há motos que nos despertam imediatamente a curiosidade, mesmo sem nunca nos termos sentado nas mesmas. E há marcas que se destacam pela sua ousadia e capacidade de tentar fazer diferente. Foi exatamente isto que a Ultraviolette conseguiu há um par de anos no salão de Milão, despertando a curiosidade para a F77, com um produto diferente e uma proposta arrojada. Agora, em 2025, fomos convidados a ir à cidade natal da marca, Bangalore, na Índia, para testar as duas versões atuais desta moto elétrica que estará muito em breve no mercado europeu.
POR JOÃO FRAGOSO • FOTOS ULTRAVIOLETTE
As equivalências das motos elétricas às motos de combustão, sabemos que muitas vezes não correspondem à realidade da potência disponibilizada. Seria impensável uma moto a combustão de 125 cc estar homologada para ser conduzida com a carta A1, produzindo 40 cv. Pois bem, no caso desta Ultraviolette, será possível conduzir esta moto na europa com carta A1 – ou de automóvel, respeitando as restrições existentes – apesar da F77 apresentar um pico de potência de 30 Kw, o que corresponde sensivelmente aos 40 cv de que falamos e um binário máximo de 100 N.m. Ainda que a potência contínua seja de 9.4 Kw – correspondendo a 12 cv – conseguimos rapidamente perceber que aceleração desta moto é bem superior a uma 125 cc.

Testámos as duas variantes, a SuperStreet e a Mach 2, muito semelhantes, mas que transmitem sensações bem diferentes, mediante o que pretendemos destas motos. Lá chegaremos. Ainda relativamente ao motor, dizer que efetivamente esta F77 oferece sensações muito semelhantes a uma moto de 300 /400 cc, principalmente na resposta do acelerador, sendo capaz de ir dos 0 aos 60 km/h em apenas 2.8 segundos. O facto de termos testado esta moto num circuito – ainda que pequeno – permitiu perceber bem como podemos explorar na plenitude o punho direito. Os três modos de condução são bem diferentes (Glide, Combat e Ballistic) sendo que o Ballistic, apesar de ser o que disponibiliza a potência total, está longe de assustar. Contudo, para alguém menos experiente, o Combat será o ideal, um pouco mais linear e semelhante a uma moto compatível com carta A1. Já o Glide, será apenas para circular na cidade e de forma muito pacífica, uma vez que a moto se mostra bastante lenta a reagir ao punho direito, e como o nome indica, serve mesmo para deixar a mesma deslizar. Ainda diretamente ligado ao motor e à energia que disponibiliza, temos 10 níveis de regeneração, muito diferentes e progressivos entre si. Para uma condução mais empenhada, o ponto ideal será entre o nível 3 e o 5, sendo que daí para cima, o efeito de travão de motor é já um pouco agressivo, algo que pode ser benéfico na circulação dentro da cidade, permitindo deixar os travão de parte quase na totalidade.
Conforto vs Prestações

Apesar de termos realizado a o contacto com esta F77 em circuito, a marca afirma que este modelo está focado na circulação citadina e na mobilidade. Concordamos que será o que a maioria dos seus compradores vai fazer, principalmente se adquirir a variante SuperStreet, com um guiador elevado e uma posição de condução bastante natural e confortável. Já a Mach 2 é quase uma naked desportiva, apresentando uma posição de condução mais agressiva e que nos fez querer sempre mais e mais desta moto. À medida que fomos rodando, íamos ficando mais confortáveis com as sensações que a Mach 2 nos transmitiu e, claramente, no momento de contar o cronómetro – que não fizemos – seríamos mais rápidos comparativamente com a SuperStreet. Isto deve-se essencialmente à forma como conseguimos distribuir o peso em cima da moto e conseguimos adotar uma posição de condução mais sobre a dianteira na Mach 2, contando na SuperStreet com maior conforto, mas menos desportividade. Dizer, ainda assim, que nesta última referida, conseguimos ainda assim adotar um condução mais aplicada e circular bem depressa, havendo claramente um ponto em que não nos é possível fazer mais pela posição adotada.
Na medida certa

Dizer que o motor surpreendeu não seria correto, pois sabíamos que apesar desta moto ser passível de conduzir com carta A1, as suas prestações seriam superiores a uma 125 cc a combustão – algo comum nas motos elétricas. Tudo o resto era uma incógnita. Mas olhando para a F77, a ideia que dava era de uma construção robusta e bons componentes a equipar esta moto. Na dianteira temos uma forquilha invertida de 41 mm com ajuste de pré-carga e na traseira um mono amortecedor, também ele ajustável em pré-carga. No departamento da travagem, a F77 é equipada com um disco de 320 mm e um disco de 230 mm, à frente e atrás respetivamente. Travagem essa que é muito assertiva e potente o suficiente para parar os 207 kg desta moto. O circuito foi bom também para perceber que os travões não acusam fadiga, mesmo quando são levados ao limite. O ABS apenas entrou em ação quando provocado, e mesmo assim, a sua prestação foi muito satisfatória, intervindo apenas o essencial – isto na dianteira, uma vez que na traseira desligámos o mesmo para tentar subir um pouco o fator diversão. Segundo nos foi dito, a travagem dianteira é exatamente a mesma que equipa a KTM 390 Duke, uma moto bem conhecida por ter uma travagem algo sobredimensionada para o seu peso e potência. Recuando um pouco às suspensões e sabendo agora quais as suas especificações, dizer que se mostraram à altura do desafio. Naturalmente, em pista, levámos as mesmas a limites que raramente vamos encontrar na via pública, algo que ainda nos deixou mais satisfeitos. A dianteira tem uma excelente sensibilidade e capacidade de leitura, ainda que em condução mais agressiva – tanto na Mach 2 como na SuperStreet – fosse necessária maior rigidez. A traseira apresentou exatamente o mesmo comportamento, algo que possibilitou perceber sempre muito bem o que se estava a passar com a moto, mesmo ultrapassando por vezes o limite das suspensões. O quadro em treliça de aço com o motor a ser parte integrante, também se mostrou em linha com o restante conjunto, cedendo por vezes em situações de maior stress, mas sempre passando um bom feedback do que estava a acontecer.
Máquina tecnológica

Para os mais desatentos, há muito que a Índia tem inúmeros engenheiros, nas mais diversas áreas tecnológicas, com excelentes capacidades. E mais do que ninguém as empresas domésticas sabem disso. Foi a partir dessa premissa que a Ultraviolette incluiu na sua equipa de desenvolvimento diversos engenheiros indianos credenciados e com experiência em empresas como a NASA ou a Tesla. Dito isto, o nível tecnológico desta F77 é bastante sofisticado. O painel TFT de 5” apresenta uma interface bastante moderna e excelente visibilidade, com acessos fáceis aos diferentes menus e funcionalidades. Nessas funcionalidades estão incluídos os modos de condução, controlo de tração regulável em 4 níveis, sensor de pressão de pneus, controlo de estabilidade e ainda assistente de estacionamento com a funcionalidade de marcha atrás. Ainda de série, a F77 conta com regulação automática dos LED dianteiros e controlo de travagem em subida. Naturalmente, podemos conectar o telemóvel ao painel, contando mesmo com um sistema de navegação no mesmo. E claro, o mais importante, tudo funciona bastante bem, nomeadamente o controlo de tração – o ABS já referimos o seu bom funcionamento – que se mostrou pouco intrusivo, e quando entrou em ação quase que não o sentimos. Quando desligámos o mesmo percebemos claramente onde e quando estava a intervir, entendemos que não era excessivo, percebendo inclusive que será certamente uma ajuda para quando os condutores menos experientes se entusiasmarem o pouco mais.
A energia

Numa moto elétrica, um dos aspetos mais valorizados é a sua autonomia. E para cumprir com a exigência dos mais rigorosos, a F77 vem equipada com uma bateria de 10.3 kWh, com um sistema patenteado de cinco camadas de segurança – mecânico, térmico, elétrico e de software. Esta bateria oferece uma autonomia superior a 200 km em cidade, baixando esse número para sensivelmente 150 numa utilização mista. Tendo em conta que falamos de uma moto que estará direcionada – e é posicionada pela própria marca – para deslocações citadinas e para condutores com carta de automóvel e A1, parecem ser números bastante razoáveis. O carregamento não podemos dizer que seja propriamente rápido, mas está na média, demorando cerca de duas horas e meia para carregar dos 20 aos 80% com o carregador de 3 KW.
Ambição com critério

O convite da Ultraviolette estendeu-se para além do teste à F77. Tivemos também a oportunidade de ver a marca revelar dois novos modelos que estarão no mercado a partir do primeiro trimestre de 2026. Uma scooter e uma moto de “enduro” se assim lhe podemos chamar, direcionada ao público mais jovem. Ambas com características muito interessantes, e que podem ser diferenciadoras no mercado europeu. Mais que tudo, esta longa viagem à Índia serviu para percebermos a estratégia da marca. A Ultraviolette que, definitivamente, quer mostrar-se ao mundo e afirmar-se no mercado internacional, sem se mostrar desesperada para o fazer. Percebemos que há um plano claro para entrar no mercado europeu, e acima de tudo, uma noção muito clara de que será um enorme desafio. Mas estão prontos. A qualidade dos seus produtos é grande e o seu caminho está a ser traçado com muita calma e critério. Prova disso é também a garantia de 5 anos ou 100.000 km que a marca oferece nas suas baterias, para além dos três anos nos restantes componentes, mostrando ao consumidor que a Ultraviolette confia nos seus produtos. Não é difícil de prever que o sucesso da marca indiana no mercado global será uma questão de tempo, se todos os seus produtos apresentarem qualidade na linha da F77.
Ficha técnica
Ultraviolette F77
Motor Motor de íman permanente
Distribuição n.d
Cilindrada n.d
Potência Máxima 30 KW
Binário Máximo 100 Nm (motor)
Versão limitada A2 Sim
Final Por corrente
Caixa Automática
Quadro Treliça de aço
Suspensão Dianteira Forquilha invertida, 41 mm, ajustável na pré-carga
Suspensão Traseira Monoamortecedor, ajustável na pré-carga
Travão Dianteiro Disco, 320 mm, ABS
Travão Traseiro Disco, 230 mm, ABS
Pneu Dianteiro 110/70-17”
Pneu Traseiro 150/60-17”
Distância entre eixos 1340 mm
Altura do Assento 800 mm
Bateria 10.3 kWh
Peso (a cheio) 207 kg
Cores Branco, Preto, Amarelo (esperado)
Garantia 3 anos
Importador Xpert Energy
PVP 10 000€ (esperado)
PONTUAÇÃO
Ultraviolette F77
Estética 4
Prestações 4
Comportamento 4
Suspensões 4
Travões 5
Consumo 4
Preço 3