2ª Parte
Tendo criado uma marca vencedora em pista, o desafio era agora transferir para as Moto Guzzi do dia a dia os mesmos valores

Nos anos 30, a marca apresenta os modelos estradistas P175 e P250, que deram origem a uma dinastia de sucesso, com as versões PE, PL, Egretta e Ardetta. A marca produz igualmente motos de competição-cliente, como os modelos Dondolino, Gambalunga, Condor e Albatros, sempre batizados com nomes de aves, um eco do emblema da águia no depósito.
Em 1939, chega o célebre modelo Airone, a “garça”, uma 250 com 4 mudanças no pedal. O modelo torna-se na mais popular media-cilindrada de Itália.
A marca experimenta com a sobre-alimentação com a 250 “Compressore” que é premiada com a Freccia Azzurra, um reconhecimento reservado a motos detentoras do recorde de Km/h da época.
Com a II Guerra Mundial à porta, os projetistas da Moto Guzzi criam o Trialce, um motocarro desmontável feito para ser largado em para-quedas. O sidecar Alce, com roda motriz, aparece com uma inovadora barra de torção que evita derrapagem e efeitos nocivos em curva.
No entanto, quando a guerra acabou, as necessidades e gostos do público tinham evoluído. A moto já não é um objeto para uns poucos entusiastas eleitos abastados, mas um meio de transporte de todos os dias, um modo do povo chegar ao trabalho.
Os fabricantes concentram-se em motos ligeiras, ágeis, de pequena cilindrada, económicas tanto na aquisição como na posterior manutenção.
A Moto Guzzi, mais vocacionada até aí para cilindradas maiores e motos de competição, adere ao espírito da época e desce de cilindrada, com a sua primeira 2 tempos, o Guzzino 65.

É um facto curioso que o preço inicial do modelo de 80.000 liras dobra em pouco tempo, por causa da inflação galopante. Mesmo assim, básico e prático, o Guzzino vende 50.000 unidades em três anos, um novo recorde fabril italiano.
Até aos anos cinquenta ainda vendeu bem, reformulado como o Cardellino, mostrando uma longevidade notável. Mesmo a meio do século, aparece o famoso Galletto, a primeira “scooter” com rodas altas, a preceder os conceitos usuais nos nossos dias.
Nas motos ligeiras, surge o Zigolo 98 e a Lodola 175, que viria a ser o último projeto pessoal de Carlo Guzzi em 1956. A tendência para a inovação é também revelada na procura dos melhores métodos de pesquisa e produção em massa.
“Em 1950, a Moto Guzzi é o primeiro e único construtor mundial a dotar-se dum túnel de vento para ensaiar protótipos à escala real, levando ao desenvolvimento das primeiras carenagens. Assim equipadas, as motos da marca superam os 200 Km/h, e estão à frente de todas as competições em pista ou estrada.”

Em 1950, a Moto Guzzi é o primeiro e único construtor mundial a dotar-se dum túnel de vento para ensaiar protótipos à escala real, levando ao desenvolvimento das primeiras carenagens.
Assim equipadas, com as chamadas carenagens ‘lata de lixo’, as motos da marca superam os 200 Km/h, e estão à frente de todas as competições em pista ou estrada.
A equipa de competição é um grupo bem equipado e com profundos conhecimentos, em que trabalham, lado a lado, homens como Umberto Todero ou Enrico Cantoni, ou Giulio Cesare Carcano, um projetista genial falecido há poucos anos, que cedo se tornará um nome mítico.
De facto, só um visionário de génio, sem medo de sonhar, poderia pensar nessa altura em utilizar um motor de 8 cilindros de 500cc numa moto!

Fosse como fosse, a Moto Guzzi V8 torna-se realidade, com uns incríveis 80 cavalos de potência e 285 Km/H de velocidade máxima.
Nenhuma outra marca tentou sequer uma configuração tão exótica, prova indiscutível da superioridade técnica da Moto Guzzi nesses anos.
A moto revela-se de grande potencial, obtendo logo os primeiros sucessos em competição, mas por essa altura a Moto Guzzi retira-se da competição, pois conhece, como todas as marcas, as primeiras dificuldades financeiras…

Em 1965, Carcano cria o motor V7, a pedido das forças italianas. O motor, baseado num 650 em V que tinha instalado num Fiat 500 seu, só por gozo, tinha características de aceleração, binário e potência muito interessantes para a época, até porque permanecia extremamente compacto, mesmo na versão de 750 cc que acabou por ser fornecida.
O modelo encontrou grande aceitação, não só na polícia e exército italianos, mas um pouco por todo o mundo. O V subiu para 900 e depois 1100 cc e foi usado pelas policias da America, Egipto, Argentina…

Até adaptado para competição, apesar de Carcano, o seu criador, afirmar em mais de uma ocasião que precisamente as características calmas que o tornavam um tão bom motor de estrada não o faziam ideal para a competição.
Nos anos setenta do séc. XX, surge a 850T e depois a V1000 California, (acima) feita especialmente para ganhar o concurso de fornecimento à Polícia americana, cujo caderno de encargos tem uma redação, feita a pensar na Harley-Davidson, que especifica um bicilíndrico em V. Com a ajuda da Polícia de Los Angeles, que ajudou a elaborar a especificação do modelo, a Moto Guzzi triunfa onde a Ducati falhara, e várias forças como o LAPD e a Brigada de Trânsito da California usam a moto.

Nos anos 70, a 850 Le Mans torna-se uma desportiva de referência, aliando estética minimalista e arrojadas formas angulares à mais agressiva combinação a sair de Mandello de Lario por essa altura. Nos anos setenta, as Guzzi conhecem sucesso em Daytona num curto espaço de tempo, antes da chegada a sério das multi-cilindros japonesas.

Do lado calmo, para a estrada, há a V5 e V35, duas pequenas 500 e 350. A marca obtém mais sucessos nos EUA através das preparações de pista de “Dr. John”, um dentista americano maluco por italianas.
Enfim, nos tempos modernos a configuração motor das Guzzi com distribuição por varetas já não podia dominar, mesmo nas fórmulas que favorecem as bicilíndricas, sem um envolvimento direto da fábrica.

No entanto, a renovada gama de estrada com que a marca entrou no Século XXI, expandindo para vários segmentos como aventura e naked, possuidoras de argumentos técnicos aliados a estética arrojada, deverá assegurar que veremos Moto Guzzi a passear a águia de Mandello de Lario no depósito por muito tempo ainda…














