O encanto do motor Boxer Quando, ainda em 1969, a marca bávara lançou a Série 5, com as denominações R50, R60 e a topo de gama, que aqui apresentamos, R75, causou grande impacto no mundo das motos. Modelos pautados pela qualidade de construção e acabamentos, dotadas de arranque elétrico (algo raro à época) e pedal, componentes bem dimensionados, peso contido, confortáveis, motor fiável e robusto.
Fortes argumentos para enfrentar as rivais na época!
POR: Pedro Pereira FOTOS: Paulo Calisto / https://www.bmw-motorrad.pt/pt/home.html#/filter-todos
Se quisermos viajar às origens deste peculiar motor Boxer, teremos que recuar até 1887 quando foi apresentado ao mundo pelo genial engenheiro Karl Benz, mas vamos antes focar-nos na sua utilização pela marca alemã, que o continua a usar ainda nos dias de hoje e com excelentes resultados.
Após a pesada e humilhante derrota na 1.ª Guerra Mundial, a Alemanha havia sido proibida de produzir aviões e motores para estes, como forma de tentar travar quaisquer propósitos belicosos que pudessem existir. Naturalmente que as empresas alemãs, incluindo a BMW, tinham de sobreviver e é aí que surge o criativo engenheiro Martin Stolle. Usando a arquitetura boxer, desenha um motor de dois cilindros, com 500 cc, refrigerado a ar e com câmaras de combustão opostas horizontalmente, mas para aplicação em motos. Os primeiros motores começaram a ser produzidos ainda em 1920 e demorou apenas três anos para que a BMW criasse uma moto de raiz, utilizando o motor de arquitetura boxer.
Com o lançamento, em 1923, da inovadora R 32, o motor boxer passou a ser associado à marca alemã e ainda o ano passado esta arquitetura de motores completou o seu centésimo aniversário. Novos desenvolvimentos, mais uma Guerra Mundial, a Alemanha de rastos, mas o boxer sobrevivia a tudo e a todos, sendo que no final da década de 60 o construtor alemão apresenta a Série 5 e o motor boxer está agora melhor que nunca, embora com nítidas semelhanças com o da pioneira R 32.
Em rigor, as primeiras alterações dignas de monta só surgiram com a adoção da injeção. A BMW Série 5 era de construção modular. Um verdadeiro “três em um”, sendo que as três motos eram basicamente iguais, tirando alguns autocolantes e o motor que se declinava no modelo de entrada, o R50/5, de 498 cc, o intermédio R60/5 de 599 cc e o topo da pirâmide R75/5, com 745 cc com uns respeitáveis 50 cv e um elevado binário de 60 Nm. O branco tem muito encanto Apesar da tradicional sobriedade da marca alemã, não há como negar que este branco tem um charme único e nos conquista ao primeiro olhar, mais ainda com as malas Krauser, de 20 litros cada, originais da época, reforçando a capacidade de viajante incansável desta moto e este motor de maior cilindrada.
O exemplar de 1970 que aqui apresentamos, está num estado de colecionador e o seu proprietário, Octávio Sousa, usa-a regularmente. É a moto que nunca o deixa ficar mal, desde que tenha em atenção alguns detalhes, nomeadamente a limitada capacidade dos travões, sobretudo se tivermos em linha de conta a performance do motor. Já foi alvo de trabalho de restauro e os manómetros já não são os originais, mas a moto no seu todo está praticamente perfeita e até o delicioso pormenor da pala no farol dianteiro lhe assenta bem, tal como as proteções dos cilindros.
Esta R75/5 é uma moto encantadora e independentemente do ângulo de visão consegue conquistar nos. Uma moto bem-nascida e muito apreciada também pelas forças de segurança, sendo que equipou as forças policiais de muitos países, tal a sua robustez e simplicidade. Impressões de condução Como não podia deixar de ser, um teste desta natureza só podia ficar completo com alguns quilómetros ao guiador (perigosamente estreito) para melhor desfrutar das suas potencialidades e perceber as suas limitações. O ritual de arranque é simples com o motor a frio, mas obedece a uma ordem: abrir as duas torneiras de gasolina para que os carburadores Bing possam alimentar os cilindros, “enriquecer a mistura ar/gasolina”, ignição ligada e só depois dar uso ao motor de arranque ou, em alternativa, ao pedal que fica em posição transversal e obriga a algum exercício. Quando o motor atinge alguma temperatura podemos “empobrecer a mistura” e fazer-nos à estrada, sendo que o motor, ao ralenti, tem aquela tradicional vibração, mas que desaparece assim que arrancamos e percebemos como esta moto é especial.
A embraiagem é algo pesada e sente-se a transmissão secundária, mas nada que nos preocupe e estamos a falar de uma senhora com mais de 50 anos que merece muito respeito, carinho e gosta de ser tratada como tal. Ainda assim, aceita uma toada mais desportiva, desde que se tenham em conta as suas especificidades. Apesar do peso ligeiramente superior a 200 kg, deixa-se conduzir com facilidade, o motor é suave e muito disponível logo a baixas rotações. O quadro tem uma rigidez assinalável e as suspensões cumprem, desde que não sejamos muito exigentes ou o piso não esteja muito degradado. Já os travões são o seu verdadeiro Calcanhar de Aquiles.
Na R50/5, com os seus modestos 32 cv, certamente que cumprem, mas nesta moto a situação é mais delicada, até porque a sua velocidade de ponta é elevada e dá facilmente para fazer voar pontos na Carta de Condução. Para agudizar, ao ter apenas quatro velocidades, não podemos reduzir de forma mais empenhada ou corremos o risco de bloquear a roda traseira com relativa facilidade e ficarmos em problemas. A solução passa mesmo por acelerar apenas um pouco mais onde tivermos condições para o fazer.
Esta duas limitações, sobretudo face às motos japonesas que agora estavam a chegar, só foram corrigidas na geração seguinte, em 1974, com a Série 6, com a adoção de uma caixa de cinco velocidades e pelo menos um travão de disco na roda dianteira. Notas finais Mesmo a R 50/5 e a R60/5 já carregam toda a mística e encanto do motor boxer, mas nesta versão mais potente somos transportados para um mundo superior e desfrutamos em pleno de uma moto que nos consegue fazer esboçar grandes sorrisos. Naturalmente que, para os cânones atuais, é uma moto completamente datada, nomeadamente no que à segurança diz respeito, mas a sua graciosidade e encanto estão lá todos. É uma moto clássica em estado puro e a sua tendência para continuar a valorizar mostra isso mesmo.
Pontuação:
Estética 4
Prestações 4
Comportamento 3,5
Suspensões 3
Travões 2,5
Consumo 4