Motores a combustão poderão ficar afinal… as clássicas agradecem
A Comissão Europeia parece ter recuado nas suas intenções de eliminar totalmente as emissões de CO₂ dos veículos novos a partir de 2035, o que na prática resultaria no fim absoluto dos motores a combustão interna.
Desse desígnio inicial, parecemos agora estar a falar de uma redução de ‘apenas’ 90% nas emissões, permitindo compensar os restantes 10% através de soluções alternativas, como filtros mais eficientes, combustíveis sintéticos, biocombustíveis avançados ou outros mecanismos de eliminação de carbono.

Esta mudança de paradigma representa um nítido afastamento da lógica de proibição total que dominou o discurso político da União Europeia nos últimos anos.
Em grande medida, isto ficará decerto a dever-se à pressão exercida pelos Estados-Membros mais industrializados, onde a fabricação automóvel representa muitos milhares de empregos, como a Alemanha e Itália.
Em várias ocasiões, representantes dos construtores como o português Carlos Tavares têm alertado para os graves riscos económicos e sociais de uma transição brusca.

A Comissão Europeia parece agora ter percebido que a descarbonização acelerada do sector automóvel comprometeria o emprego, a competitividade e a capacidade industrial, especialmente quando a Asia se afigura como um concorrente cada vez mais formidável.
Assim, as reduções de emissões poluentes não podem assentar numa única solução tecnológica, e o discurso reformulado aponta agora para uma transição energética mais gradual, adaptada às realidades do mercado.
O motor de combustão, no seu presente formato, deixa de ser tratado como um elemento a eliminar de forma imediata e absoluta. Nesse contexto, o debate em torno do fabrico de motos, já de si menos poluentes em vista da cilindrada mais reduzida, e da continuidade dos veículos clássicos, em particular, ganha novos contornos.
Estudos recentes têm demonstrado que os veículos clássicos têm um impacto ambiental residual no conjunto do tráfego rodoviário: mesmo agrupando carros e motos, representam, na prática, apenas 0,2% do total de quilómetros percorridos, em vista da utilização meramente ocasional para passeios ou encontros, rodando muito abaixo da média anual de quilómetros dos veículos modernos.

Para não falar do facto que as clássicas, com o seu longo ciclo de vida, já há muito amortizaram a pegada energética associada à sua produção inicial. Estes dados reforçam a ideia de que os veículos históricos devem ser encarados como património técnico e cultural, parte integrante da história industrial de muitos países, em vez de serem vistos como um problema ambiental estrutural.
Ver qualquer motor de combustão como um problema ambiental não leva em conta a proporcionalidade dos efeitos do seu uso e do seu impacto efetivo e ignora fatores económicos e sociais resultantes do seu valor cultural e até histórico, pelo papel que desempenham em eventos, museus e atividades turísticas.
Com a União Europeia a rever estratégias e ajustar metas para o setor automóvel, o novo discurso europeu parece agora reconhecer que nem todos os veículos com motor de combustão têm o mesmo peso ambiental, o que já é um passo na direção certa para políticas públicas mais justas e eficazes.
A utilização ocasional dos veículos clássicos e o seu reduzido impacto nas emissões globais demonstram que estes não podem ser usados como arma de arremesso na discussão ambiental.
As clássicas representam um património técnico e cultural cuja preservação é desejável, essencial, e compatível com uma transição energética mais gradual, equilibrada e baseada em fatos e não em lobis da moda.














